Sergio Moro é um dos pré-candidatos que defendem o fim da reeleição para cargos do Executivo
No próximo mês de junho, serão completados 25 anos da emenda constitucional que permite a reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos no Brasil. Criada em meio à polêmica, pois gravações da época flagraram deputados federais do Acre relatando recebimento de dinheiro para votar em seu favor, a reeleição para cargos do Executivo vem sendo questionada desde antes de sua implantação, pois o tema não obteve consenso no Parlamento.
Promulgada pelo Congresso Nacional, a mudança beneficiou a todos que já exerciam mandatos no Executivo, como o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que, no ano seguinte, 1998, pôde se reeleger a mais 4 anos no Planalto.
Seus defensores argumentam que quatro anos de mandato podem se mostrar insuficientes para a implantação de projetos de governo mais duradouros. Os contrários argumentam que a reeleição permite o uso da máquina pública e desvia o mandatário/candidato das atribuições da governança no ano de eleições. Outros defendem mandatos maiores para compensar o fim da reeleição.
Diversas propostas foram apresentadas no Congresso e são muitos os candidatos que já afirmaram ser contra a medida, mas, acabaram cedendo e disputando reeleição posteriormente. Agora, em ano eleitoral, o assunto volta à tona. Ao menos seis pré-candidatos à Presidência da República afirmam ser contrários à reeleição, número maior que o de 2018, quando apenas três dos 13 candidatos declararam ser contrários ao instrumento. Entre eles estava o atual chefe do Executivo, Jair Bolsonaro, que deve tentar um novo mandato neste ano. Ao Estadão, em outubro de 2018, Bolsonaro chegou a afirmar que, caso eleito, pretendia patrocinar uma “excelente reforma política”, que contemplaria o fim da reeleição.

Entre os nomes que seguem defendendo o fim da reeleição está o pré-candidato à Presidência Sergio Moro (Podemos). Ele concedeu entrevista à Rádio Jornal Caruaru, nesta sexta-feira (7), e disse que a possibilidade de concorrer a um novo mandato ainda no cargo “não funcionou no Brasil”. “A gente precisa acabar com a reeleição para presidente da República. Isso precisa ser feito já em 2023, porque isso não funcionou no Brasil. A gente vê, muitas vezes, alguém eleito para o cargo esquecer, desde os primeiros dias, que ela chegou lá para servir às pessoas e não para servir a si mesmo. Isso tem que mudar”, defendeu o ex-juiz que tem aliados no Congresso, como Junior Bozzella (PSL) e Renata Abreu (Podemos), que trabalham em uma nova PEC pelo fim da reeleição.
Recentemente, o governador João Doria (PSDB), que também deve disputar a eleição, argumentou que, durante o governo de FHC, a reeleição ajudou o País a se estabilizar macroeconomicamente e consolidar o Plano Real. Mas, recentemente, a possibilidade se mostrou inadequada. “Levou governos à irresponsabilidade fiscal na busca pelo segundo mandato”, disse ele ao Estadão. A senadora Simone Tebet o e o pré-candidato do Novo, Felipe d’Ávila, também criticaram a medida.
Ao JC, especialistas e políticos falaram sobre os impactos negativos e positivos da reeleição e discutiram sobre sua continuidade. Uma das principais vozes do centro no País, o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung viveu a experiência de se reeleger, em 2006, e de abrir mão da reeleição, em 2018. Hoje, ele é fortemente contrário ao tema e defende que o próximo presidente deve fazer um governo de transição, sem reeleição.
“Me posicionei contra a reeleição desde quando foi apresentada no governo FHC, porque, na minha visão, o país não tem instituições consolidadas para fiscalizar a hipótese da reeleição. Ou seja, você acaba submetendo o processo às máquinas eleitorais, mas, de lá para cá, melhor que o ponto de vista é a experiência. A experiência que o Brasil viveu não é boa, tanto que o próprio Fernando Henrique, proponente do instituto da reeleição, fez autocrítica. Então, esse caminho não deu certo e quanto mais rápido consertar, melhor” disse o ex-governador.

Hartung aponta que esse é o melhor momento para rever a medida. “Viemos de um ciclo muito complicado desde a recessão em 2015 e 2016, uma situação difícil, em seguida, após a recessão, tivemos um crescimento medíocre, e o passo seguinte foi cair na pandemia, enfrentamos um período longo, de enorme sofrimento da população, principalmente dos mais pobres, o processo eleitoral precisa ganhar sentido e acho que o sentido é pensar transição, pensar um programa que o líder de antemão abra mão da reeleição. Quando um governante não fixa na reeleição, ele lidera o que precisa ser liderado. Quem entra obcecado, não governa a favor do país e dos que mais necessitam do governo funcionando”, disse.
O ex-governador destaca, ainda, ser contrário à reeleição de prefeitos e governadores. “Não é problema de um governo, querem fulanizar, é um problema de todos os governos, toda vez o governo no primeiro mandato não olha o que precisa fazer, ele olha para as condições de uma reeleição e isso arrebenta a economia brasileira. Olha as decisões fiscais recentes, os economistas apontam prejuízo ao país, mas é a marcha da insensatez, é o objetivo único e permanente da reeleição”, comentou.

No último ano do mandato como governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB) ainda não disputou reeleições. Ele se diz contrário à medida. Em 2016, o tucano era prefeito de Pelotas (RS) e liderava pesquisas de intenção de voto quando anunciou que não concorreria à reeleição, dando lugar à sua vice. Como justificativa, ele afirmou: “Sempre fui contra a reeleição. Não é agora, que ela em tese me beneficia, que vou mudar de ideia. Na política, é preciso ter coerência entre o discurso e a prática.”
Passados quase sete anos, Eduardo Leite segue acreditando que a reeleição prejudica o processo político e de gestão de um governo. O governador escreveu ao JC e disse que só conseguiu realizar reformas e privatizações porque não focou em se reeleger.
“No RS, nos últimos três anos, fizemos profundas reformas previdenciária, de civis e de militares, e administrativa, e aprovamos o processo de privatizações e de concessões de empresas públicas. Graças a esse processo de modernização do Estado, foi possível ajustar as contas – estávamos há 57 meses sem pagar o salário do funcionalismo em dia, e atrasávamos o repasse de hospitais e dos municípios na área da Saúde. Passamos de um Estado que mal pagava suas contas para um Estado que anunciou, ao longo do segundo semestre de 2021, R$ 4,5 bilhões em investimentos a serem realizados até o final de 2022 em praticamente todas as áreas estratégicas do governo do Estado. É o programa Avançar. E tenho convicção de que não teríamos chegado até aqui se não fosse minha disposição a não ser candidato à reeleição agora, em 2022”, afirmou.
Leite defende, ainda, que o modelo político brasileiro, fragmentado como é, se enfraquece pela reeleição. “Quando é preciso construir apoio político para formar um governo, a reeleição se torna o principal entrave para os avanços, e acredito que isso seja prejudicial para o andamento dos projetos do Executivo, na esfera em que for”, concluiu. Eduardo Leite não parece ser o único gaúcho contrário à reeleição. O Rio Grande do Sul é o único estado brasileiro que não reelegeu nenhum governador.
Roberto Gondo, professor de comunicação política da Universidade Presbiteriana Mackenzie explica que o assunto reeleição sempre foi discutido em momentos pré-eleitorais e se torna pauta de candidatos da oposição. “É uma forma de tentar buscar eleitores que também são contrários à medida e que entendem que o governante tende a usar a máquina pública para ganhar visibilidade. E há uma briga relativamente injusta (na eleição), apesar de que alguns candidatos, mesmo com mandato, perdem. Mas esses acabam saindo na frente na questão de ser conhecido pela população”, disse.
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Por outro lado, Gondo disse que políticas políticas públicas levam tempo e a mudança constante de poder pode ser um empecilho. “Algumas ações públicas levam tempo, com planejamento e realização. Muitas não consolidam em tempo hábil. A discussão sobre reeleição não é simples, pois quando muda o grupo político, alguma políticas iniciadas no governo anterior acabam se perdendo e isso é desperdício de recursos”.
Graziella Testa, doutora em ciência política e professora da Escola de Políticas Públicas e Governo da FGV, explica que a reeleição força a accountability, ou seja, força os gestores a prestar contas ao fim do primeiro mandato. “Nos Executivos ao redor do mundo, é muito raro um lugar onde não exista reeleição, mas com limite, uma ou duas. A vantagem da reeleição e porque ela faz sentido na maior parte dos presidencialistas é porque há a prestação de contas, que é a base da representação política. O político vai fazer uma série de promessas, tem programa de governo a cumprir, depois ele cumpre ou não e o eleitor pode ou recompensá-lo ou puni-lo, caso ele faça um governo ruim. Se o indivíduo não tem em vista que pode ser reeleito, o eleitor perde uma arma poderosa sobre ele. Se hoje esse poder do eleitor não é exercido de forma mais plena, depende de maior politização da população e de uma educação política mais satisfatória, até de acesso aos resultados dos trabalhos dos políticos”, comentou.
Ainda de acordo com a especialista, o fim da reeleição não vai atacar o problema do uso da máquina pública como alguns defendem. “Do mesmo jeito que o político usa a máquina para reeleger, pode usar para eleger um sucessor. Não sei se é o remédio certo, deveria haver uma série de medidas de punição ao uso da máquina, já tivemos restrição maior, houve extenso conjunto normativo, mas é preciso continuar com medidas paulatinas. Melhor que algo drástico e que mude o sistema político. Além disso, há quem use a máquina para tirar todo o proveito que puder, pois não pode ser reeleito. Há o fenômeno nos Estados Unidos do lame duck, ou ‘pato manco’, que é o político que não irá se reeleger, não há mais nada a perder e o eleitor perde controle sobre ele”, pontuou Graziella Testa.
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